Onde Vivem Nossas Memórias? A Dança dos Engramas no Cérebro
Por Silviane Silvério
3 de novembro de 2025 | Leitura estimada: 6 minutos
Você já se perguntou onde ficam guardadas as memórias — aquela risada da infância, o cheiro do café da avó, o primeiro beijo, ou até aquele insight transformador que mudou sua vida?
A resposta não está em um “arquivo” fixo, como numa gaveta mental. Pelo contrário: nossas memórias vivem em redes dinâmicas de neurônios, espalhadas por diferentes regiões do cérebro, que se conectam, reforçam e até se reconfiguram com o tempo. Essas redes têm um nome científico: engramas.
Como as memórias são guardadas no cérebro?
As memórias são armazenadas no cérebro através de um processo complexo que envolve várias regiões e tipos de células cerebrais. Inicialmente, a formação de memórias começa no hipocampo, uma estrutura crucial para a codificação de novas informações. Quando aprendemos algo novo, os neurônios comunicam-se entre si através de sinapses, fortalecendo as conexões sinápticas por meio de um processo chamado de potencialização de longo prazo. Isso torna as sinapses mais eficientes na transmissão de sinais, essencial para a consolidação das memórias.
Posteriormente, as memórias são transferidas do hipocampo para o córtex cerebral para armazenamento de longo prazo. Durante o sono, especialmente nas fases de sono REM e de ondas lentas, ocorre a reorganização e consolidação das memórias, permitindo que se tornem mais estáveis e menos suscetíveis ao esquecimento. A interação entre diferentes áreas do cérebro, como o córtex pré-frontal e a amígdala, também desempenha um papel importante, ajudando a associar memórias a emoções e contextos específicos. Assim, o armazenamento de memórias no cérebro é um processo dinâmico e adaptativo, que envolve a comunicação contínua entre várias regiões cerebrais.
O que é um engrama?
O termo foi cunhado há mais de 100 anos pelo biólogo alemão Richard Semon, mas só agora, graças aos avanços da neurociência moderna, estamos começando a entendê-lo de fato.
Um engrama é o traço físico de uma memória: um grupo específico de neurônios que se ativam juntos durante uma experiência e, ao se conectarem mais fortemente, “gravam” aquela informação.
Não é um único neurônio, mas uma orquestra neural — e cada memória tem sua própria partitura.
Por exemplo: ao caminhar por um campo de lavanda, seus sentidos captam a cor roxa, o aroma floral, o calor do sol.
Esses estímulos ativam neurônios visuais, olfativos e somatossensoriais. Se a experiência for significativa, esses neurônios se conectam mais intensamente. Depois, basta ver uma foto de lavanda ou sentir seu perfume para reativar toda a rede — e reviver a memória.
As três fases da vida de uma memória
Codificação:
É o momento em que a experiência sensorial é transformada em sinal neural. Nem tudo vira memória: apenas o que é relevante, repetido ou carregado emocionalmente tem maior chance de ser codificado.
Consolidação:
Durante o sono — especialmente o sono profundo —, o cérebro repassa e fortalece essas conexões neurais. Proteínas são sintetizadas, sinapses se multiplicam e o engrama se torna mais estável. É por isso que dormir após aprender algo novo é essencial.
Recordação:
Quando um estímulo externo (um cheiro, uma música, uma palavra) reativa o engrama, a memória retorna. Mas aqui está o mais fascinante: toda vez que recordamos, a memória se torna temporariamente instável. Isso significa que podemos reescrevê-la — consciente ou inconscientemente — com base em nosso estado emocional atual, crenças ou até no modo como a contamos a outra pessoa.
Memórias não são estáticas — elas evoluem
Com o tempo, tendemos a perder detalhes e reter apenas a essência emocional. Lembra-se daquela viagem à praia na infância? Talvez você já não saiba o ano exato, mas ainda sente a alegria do sol na pele. Isso acontece porque o engrama se simplifica: menos neurônios, menos conexões, mas o núcleo afetivo permanece.
Esse processo não é falha — é adaptação. O cérebro prioriza o que é funcional para nossa identidade e sobrevivência emocional.
E o esquecimento? É perda ou silêncio?
O esquecimento muitas vezes não significa que a memória desapareceu, mas que o engrama se tornou inacessível — “silencioso”. Estudos com camundongos mostraram que, mesmo em casos de amnésia, reativar artificialmente os neurônios do engrama restaura a memória. Isso sugere que, em muitos casos, o problema não é a ausência da memória, mas a falha na recuperação.
Em doenças como o Alzheimer, a degradação pode ser mais profunda — com perda real de neurônios e sinapses. Mas mesmo aí, pesquisas emergentes levantam a hipótese de que parte das memórias pode estar apenas “desconectada”, não apagada.
Reflexão final: memória como prática de autoconhecimento
Se nossas memórias são redes plásticas, moldadas pela emoção, pelo sono, pela repetição e até pelo modo como as narramos… então temos mais poder sobre elas do que imaginamos.
👉Podemos escolher quais experiências reforçar com atenção plena.
👉Podemos honrar o sono como um ato de cuidado com a memória.
Podemos reescrever narrativas dolorosas com compaixão, sabendo que cada recordação é uma oportunidade de cura.
Afinal, nossa identidade é feita de memórias — mas não de memórias fixas. Elas são vivas, maleáveis e profundamente humanas.
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🌿 Lembre-se: entender como a mente funciona é um passo poderoso rumo à maturidade emocional, à empatia e à liberdade interior.
Fonte inspiradora:
The Conversation – “Como as memórias são armazenadas em nosso cérebro”
🔗 https://theconversation.com/como-as-memorias-sao-armazenadas-em-nosso-cerebro-229649
Conheça mais sobre meu trabalho:
🎥 Canal Mapas do Autoconhecimento – YouTube
Com carinho,
Silviane Silvério
Educadora em saúde integrativa e autoconhecimento
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